<span class=”abre-texto”>Todos os dias, com maior ou menor abrangência</span>, um aprendizado. Às vezes, uma ampliação de consciência através do estudo. Outras vezes, a observação das pessoas e suas interações oferece informações muito ricas. De vez em quando, uma nuvem sombria possibilita incremento do meu repertório de respostas. E, em quase todas as vezes, aprendo nos diálogos nos quais me envolvo. Eles me trazem luz. A caminhada é rica.
Tenho plena consciência de que esse aprendizado, longe de ser romântico, é originado em uma decisão de consciência. De estar presente, de acionar escolhas diferenciadas em momentos distintos.
Ver através da névoa do frenesi oferecido pelos dias que vivemos não é exatamente algo que pudesse estar em um manual de autoajuda, como um de “dez maneiras para obter a consciência”. Tenho medo destas soluções muito rápidas e mágicas, pois às vezes me parece que, no lugar de retirar camadas de opacidade, agrega novas. E a pessoa, na ilusão de que faz contato, o fará através de mais uma camada de autoengano.
Consciência supõe conhecer a si mesmo. A jornada de vida até aqui, seus impactos e comportamentos consequentes. Compreender a si mesmo e as respectivas razões de ser e conviver.
Muita dessa informação necessária ao processo de reconhecimento não está disponível para acesso rápido, imediato, da memória explícita. Assim, a disponibilidade para buscá-la precisa se aliar ao risco imponderável das respostas inesperadas que estão em cantos desconhecidos.
O cuidado de observar a nós mesmos pode se transpor para o olhar cuidadoso às outras pessoas, validando suas histórias e, principalmente, ouvindo suas histórias. Acho que transita por aqui o mistério do vínculo entre humanos, tema que tem habitado meu condomínio mental nestes dias.
É impressionante o momento em que o campo relacional entre duas pessoas se ilumina com a compreensão. O tradutor de significados presente, mediando o encontro, a atenção focada de cada um validando e reconhecendo o outro. O diálogo flui, sem pressa e sem a abrasão de competição ou comparação – as pessoas vivenciam nesses momentos a doce delícia da complementariedade.
É natural pensar na miséria dos campos relacionais que são palcos de violências de todas as naturezas. Desde a mentira deslavada até a violência física, passando por cada uma das estações do horror dos jogos psicológicos ou de poder que ocupam o espaço gerado pela ignorância.
O pavor que sinto ao ver ou saber de situações assim é tão intenso quanto o prazer de participar ou ver acontecer a fluidez entre pessoas. Independentemente dos propósitos que movimentam as pessoas em campos relacionais abrasivos, é como se estivessem em completa ausência de luz ao viver uma das mais íntimas atividades humanas que é o conflito.
Ver pessoas que foram escolhidas para cuidar dos interesses públicos utilizando a violência como método, como estratégia, como modo de vida, é apavorante. Era esperado que estivessem debatendo (ainda que com vigor) o interesse coletivo, o bem-estar, o sobreviver cidadão.
O digladiar deselegante e estéril inflama o tecido da convivência e (pior pesadelo) pessoas, perdidas em suas próprias sombras, sentem-se representadas e autorizadas pela violência pública. É curioso.
Ao buscar vencer o outro, a pessoa perde o controle de si mesma, e ela mesma se entrega. Passa para mãos (às vezes estranhas) o controle de si mesma. Então não vê, não nota, não qualifica. Pelos relacionamentos abrasivos, a solidão passa a ser sua companhia.
De um lado o vínculo, do outro o conflito. Entre os dois, miríades de coreografias do conviver. Cada uma delas é uma tentativa de driblar a solidão. Para quem quer aprender ao viver, são oportunidades preciosas de valorizar a caminhada. E procurar e nutrir vínculos.