<span class=”abre-texto”>Uma sequência de decisões</span> me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste “aqui” e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.

A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim”.

Preciso saber que a pessoa que chega até aqui, no presente, é consequência de todos os eventos, contextos, história, cultura com os quais estive direta ou indiretamente conectada. Aspectos associados aos meus pensamentos, sensações, emoções, sentimentos, ações, relacionamentos, aprendizados – fornecem fragmentos que compõe este mosaico dinâmico do meu eu. Talvez um caleidoscópio seja mais representativo do que um mosaico, pois a composição não é estática.

Os pequenos pedaços de experiências irão se compondo em formações mutatis mutandis de modo a atender aos diferentes estímulos. Inúmeros arranjos, automáticos na essência e nem sempre adequados para atendimento da demanda imediata, uma vez que a atualização necessária pode não ter acontecido.

Uma vez que ainda não podemos nos transportar através do tempo, o que é uma pena – (eu gostaria demais de visitar o meu passado com a consciência de hoje!), a tarefa que se apresenta é conhecer os fragmentos das experiências, seus impactos e significados. A partir do conhecimento compreender e fortalecer a decisão de novas alternativas do viver e do viver com.

Compreender a mim mesma significa compreender as minhas circunstâncias e os significados que atribui, ao longo da minha caminhada a cada uma, além dos comportamentos associados e consequentes.

E hei de honrá-las, a cada circunstância percebida, para em algum momento adotar outros padrões de pensamentos e comportamentos.

Tenho consciência que a compreensão não se dará integralmente. Há aspectos da nossa experiência vivida que não estarão registrados na memória ou registrados visceralmente, o que permite escapar da visão mais lúcidas dos acontecimentos. Uma boa parte das circunstâncias estarão no mundo do inconsciente. Emergirão aqui e acolá, ou permanecerão reprimidos às vezes pela vida afora.

Assim, preciso lidar com o que se apresenta, com a capacidade de compreensão que tenho no presente o que pode gerar subsídios para pequenas decisões, acesso a pequenas e novas alternativas e, principalmente, a possibilidades de desfazer nós e emaranhamentos que consomem tempo!

Tempo! Esta variável inegociável que perdida não retorna. Resolver e assentar nossas circunstâncias pode nos permitir transitar pelas novas circunstâncias sem o “elástico” que nos arrasta para o passado, nos arrancando abruptamente do presente e da visão lúcida da realidade objetiva.

Cada entendimento atualizado pode abrir portas para relacionamentos mais fluidos e ações mais coerentes e honestas. Compreender o meu funcionamento também pode gerar um olhar de compreensão às circunstâncias do outro e me dará recursos para saber o que fazer com o que se apresenta.

À medida em que identifico e entendo circunstâncias e sentidos, ampliarei o acesso à realidade objetiva. Hora de me dedicar a entender e envergar o meu propósito. Poderei então balizar minhas decisões a partir do quanto se aproximam ou distanciam do sentido central da minha vida. Dádiva! Uma construção de todos os dias, de decisão deliberada pela consciência.

Do meu propósito faz parte não ser refém das circunstâncias que não me pertencem, ou valores que violam meus princípios, ou ações que me constrangem, ou violências de qualquer natureza. Quanto mais consciente estiver, mais capaz serei de identificar e me aproximar ou fugir de circunstâncias que fortaleçam ou fragilizem meu propósito.