<span class=”abre-texto”>Quando somos espectadores da coreografia</span> sagrada de um relacionamento humano fluido, enxergamos o resultado e sempre parece mágico. É bem comum, neste momento de encantamento, a idealização, como se o acaso houvesse reunido aqueles seres e sua afinação tivesse surgido espontaneamente. Do nada. Sem esforço algum.

Assim como as grandes árvores, o relacionamento entre humanos surge a partir de uma semente. Pequena e frágil, sozinha nada faz. Sua simplicidade e quase invisibilidade contêm um universo.

Para vivificar, a semente precisa encontrar terreno adequado, acolhedor – que lhe permita acomodar-se para aguardar sua morte convertida em raízes e galhos. Desaparece a semente, transmutada na futura árvore.

Muito semelhante ao encontro de humanos, o humano semente encontra o humano terreno – deste encontro, transformações bem próprias dos encontros profundos, nos quais a fluidez constrói novos formatos de sentir, pensar, conviver. No início, uma frágil estrutura surge com potencial de vida.

Para perdurar, o encontro precisa de cuidados. Pequenos gestos, pequenos movimentos, quase imperceptíveis de presença, em dimensões distantes das convencionais de tempo e espaço. Diálogos. Presença. Interesse manifesto, cujo significado, maior que a palavra, aquece e conforta.

As raízes vão criando corpo, nutridas pelo diálogo livre, pelo afeto incondicional, pelas pontes de contato e pela escolha de ser livre de julgamentos. Respeito profundo ao outro ser que poderá experimentar a liberdade de crescer, expandir, voar. A nutrição do encontro está também na escolha deliberada de não controlar, de ser feliz na independência de estar na companhia do outro sem predar… Sem matar. Sem ressecar.

A árvore, símbolo do relacionamento livre, é bela e generosa. Frondosa, disponibiliza sombra e frutos sem comercialização. Acolhe risos e choros, escuta quando é de escutar; fala quando é de falar. Não se abala com os abalos à volta.

Olhando assim, esta abundância, me agonia pensar nos relacionamentos pautados na escassez, na competição, na disputa.

Tantas sementes morrendo em meio à aridez, quanta árvore cortada quando precisaria de apenas um pouco de nutrição.

O não prestar atenção ao que acontece no florescer e frutificar faz o ser humano, na sua pressa sem sentido, perder o que de fato vale a pena ser vivido. Pequeninos momentos, quase imperceptíveis de vida pura em andamento.

O não prestar atenção leva os seres humanos comuns a uma busca frenética por compensações e leva o humano público à indiferença aos demais e às inúmeras sementes possíveis.

O que de fato importa não gera publicações grandiosas, charmosas, retocadas. O que de fato importa está disponível aos que estão atentos. Com os olhos da alma bem abertos.

Cada mágica percebida foi antecedida de cultivo, nutrição e respeito. E podas cuidadosas. Pois também são fundamentais nos relacionamentos. Renunciar aos desnecessários pode ser tão ou mais precioso do que buscar os necessários.