<span class=”abre-texto”>Nossas emoções nos protegem</span> ou nos arrastam? Demoraram séculos até que as emoções fossem percebidas e incluídas como personagens relevantes no palco biofisiológico do ser humano. Ainda herdamos alguns equívocos dessa caminhada ignorante, expressados com afirmações como “eu sou uma pessoa racional”, ou “precisamos controlar nossos sentimentos”, ou a associação da expressão das emoções à fraqueza.

Pesquisadores de diferentes áreas colocaram sob seu cone de atenção o entendimento de mecanismos tão sofisticados e fundamentais para o bem viver, ou até mesmo para o viver. Enquanto estudavam, escutavam (e ainda há quem as fale) frases como “esta mulher está descontrolada, são os hormônios!”, “isso não é coisa de homem, engula o choro!”, “homem que é homem não tem medo”, “nada de raiva querida, seja uma princesinha!”. Ditas por pessoas de importância na vida da criança, essas frases deixam rastros de culpa e dor, inadequação, vergonha, que impulsionam comportamentos e ações relacionais.

Observa-se em algumas comunidades escolares e familiares um movimento de prover educação emocional para os pequenos. Esses pequenos poderiam crescer convivendo com as emoções, sabendo as nominar, e entendendo o seu poder como parceiras na sobrevivência. E por aí que caminhamos rumo a uma saúde que integra as diferentes dimensões da pessoa.

É preciso considerar também os eventos das vidas das pessoas que fazem tais afirmações. Elas tendem a não ter autorização para sentirem o que sentem, e acabam por disfarçar os sentimentos, dando a eles nomes que possam caber nas exigências sociais.

Nas distensões, algumas coreografadas como balés da discórdia, pode-se assistir aos interlocutores saírem do papel ensaiado, e iniciarem uma escalada de descontrole emocional que pode engatilhar as pessoas que, distraídas, estiverem ao redor da crise.

Antes de mais nada, não se pode segmentar entre emocionados e pensantes. O sentir pode embasar o pensar e, mais espetacular, o pensar pode arremessar ao sentir intenso. Inclui-se aqui uma reflexão semiótica a respeito da palavra “ressentimento”. Ele contém signos dos dois sistemas – um sentimento “sentido” repetidas vezes, a partir de um pensamento “pensado” repetidas vezes. Assim, os pensantes experimentam, e a razão inevitavelmente será enviesada pelas emoções.

É necessário que se inicie uma pequena mudança de chave, a partir de uma constatação: as emoções não podem ser controladas, uma vez que elas acontecem um tempinho antes de que possamos percebê-las. Mas elas podem ser calibradas.

Primeiro, dá-se nome ao que estou sentindo. Raiva, alegria, nojo, ciúme, rejeição, etc. Nome dado, sensação acolhida – vamos ao próximo passo. A partir do nome, procura-se entender o que engatilhou a emoção (porque pode ser uma experiência vivida, ou a lembrança dessa mesma experiência). Identificado o momento emocionalmente carregado, é hora de dar um tempo.

O tempo é bem-vindo para pensar, respirar, entender, e para decidir. Não necessariamente nessa ordem. Cada uma das etapas é parte integrante da calibração. E não é muito tempo, não. Noventa segundos podem fazer a diferença. Se possível, saia de cena. Lave o rosto, tome uma água, dê uma volta na quadra, respire profundamente (lentamente). E pense no que fazer. Pergunte “o que é adequado fazer, neste momento?”.

Várias ações são necessárias: identificar se o gatilho nos pertence, quando é do nosso funcionamento, ou se a seta foi atirada pelo descontrole de alguém por perto. Se for meu, preciso me concentrar para acolher meu desconforto, acomodá-lo, entender, e adotar um padrão que possa me proteger nas ocorrências futuras. Se for do outro, é lá que precisa ficar. Preciso deixar bem separadinho: o que é meu é meu; o que é do outro é do outro.

É um começo. Hoje, há muito para ler, ouvir, entender, e observar dos sábios – pesquisadores ou mestres generosos – que nos ajudam a compreender, honrar, e utilizar o conhecimento das emoções com sabedoria.